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sábado, 9 de abril de 2011

Meus Contos - Jesus Multiplicou meu lanche

Um conto escrito por Leandro Silva.


            Acordei aquele dia elétrico. Não sei porquê. Uma mistura de ansiedade com vontade de correr o mais rápido que eu pudesse para estar ali com ele.
            - Jacó meu filho, venha tomar café direito ! – minha mãe gritou comigo, pois eu já estava arrumando minhas coisas e me aprontando para sair.
            - Não dá tempo mãe, ele vai passar por aqui daqui a pouco e se eu perco pra onde ele vai não consigo mais alcançá-lo por causa da multidão.
            - Mas menino, assim você não vai crescer forte e saudável como seu irmão Asafe. Você está tão mirradinho, precisa se alimentar direito !
            Nossa família tinha um orgulho, quase uma tradição de que todos os filhos homens eram bem fortes e avantajados. Meu pai se orgulhava em dizer para todos da sinagoga, que seu filho Asafe era um dos mais fortes da família, que agüentava o tranco do serviço que lhe davam facilmente. Nunca reclamava de nada. E eu, um tanto quanto pequeno e franzino, era considerado o mais sensível, intelectual. Na verdade um outro jeito de me chamar de frouxo mesmo, porque para meu pai, homem que é homem tem que ser grosso e desajeitado.
            Minha mãe, como toda mãe judia, era superprotetora e não me deixava em paz por um segundo. Acho que se apegou a minha por esta questão de ser mais sensível. Como mulher e também desprezada por todos, acaba sentindo na pele o mesmo preconceito que eu e assim se identifica comigo. Eu a amo, mas tem horas que ela me deixa louco !!
            - Leva um casaco meu filho. E olha, toma aqui um lanche pra você comer mais tarde. Esses pregadores do deserto falam tanto que chega uma hora que você tem que se alimentar né ?
            - Tá bom mãe – respondi inquieto e com a mochila nas costas, sendo fechada após colocar o lanche preparado por ela.
            - E cuidado no deserto hein ? Não fique muito longe do povo, cuidado com este solão na cabeça e qualquer problema você vem pra casa correndo, tá bom meu pequerrucho ?
            Este apelido que ela me colocou eu odiava ! Mas resolvi não ralhar com ela pra que ela me liberasse logo.
-         Tá bom mãe, posso ir agora ?
-         Pode, dá um beijo na mamãe.
-         Smack ! E saí correndo, porque já avistava a multidão
passando na rua de trás e pelo número de pessoas, hoje a pregação ia ser longa.
            Andamos por mais de uma hora. Naquela multidão se via de tudo. Homens com seus burros de carga lotados e com a família; mulheres grávidas com crianças a tiracolo chorando por causa do sol e do cansaço; idosos se arrastando um entre o outro; crianças correndo e gritando fazendo aquela algazarra; Muitos, mas muitos casais e famílias juntos, seguindo aquele caminho como se fosse uma procissão do dia da expiação.
            Na frente estava ele e seus discípulos. Quando penso que eram homens que deixaram tudo para segui-lo, abandonaram suas próprias vidas e famílias para seguirem uma pessoa ! Eu tinha uma grande vontade de ser um discípulo e estar junto com eles. Mas minha mãe tinha me proibido porque me achava muito novo e tinha medo dos perigos que eles enfrentam, e que eu precisava era ajudar meu pai na loja.
            Como é que pode sair tanta coisa de uma cabeça só ? Da onde ele tira tanta sabedoria e coisas bonitas ? Da última vez que eu assisti ele falando, estávamos ao pé de um monte e ele falou sobre ser bem aventurado, ser pacificador, ser humilde. Todos ficam de boca aberta e dá pra você ouvir um passarinho cantando lá longe quando ele está ensinando. Todo mundo presta atenção e ninguém dá um pio.
            Chegamos ao lugar. Ele escolheu um local onde tinha uma relva verde, rala mais boa pra sentar e se acomodar. Todo mundo foi se sentando, se acomodando em silêncio.
            - Porque o reino de Deus é semelhante a uma mulher que tendo perdido uma dracma, varreu diligentemente a casa até encontrar. E quando a encontrou, correu para sua amigas e vizinhas e disse: “Vinde, festejemos juntas porque tinha perdido a dracma e agora a achei.”
            Naquela hora, avistei um monte de mulheres dando risada, sozinhas. Outras comentando umas com as outras algo mais ou menos como que aquilo que estavam ouvindo já tinha acontecido com elas e como era maravilhoso ouvir alguém que sabia exatamente do cotidiano delas, principalmente um homem.
            A pregação continuou durante mais algum tempo. Minha barriga começou a roncar. Já tinha saído de casa há 4 horas e meia e a última coisa que tinha colocado na boca foi o café que engoli antes de sair de casa. O sol já começava a se pôr e todos começaram a se inquietar. O burburinho aumentava e todos se preocupavam com o quê iam comer, que horas iam voltar pra casa, o que iam fazer anoitecesse antes de chegarem em casa. O choro de algumas crianças aumentava e alguns homens começavam a ficar impacientes.
            De repente o mestre parou de falar. Eu estava meio longe e não ouvia exatamente o que ele dizia. Mas o pessoal ia passando de boca em boca o que ele dizia até que chegava em quem estava mais atrás. De vez em quando o vento trazia algumas palavras dele e podíamos ouvir a voz doce mas poderosa dele.
            Mas agora ele estava falando com seus discípulos, orientando e gesticulando e apontava para a multidão. Eu pensei que era uma boa hora para pegar o lanche que tinha trazido, preparado pela minha mãe e devorar. A barriga já estava comendo as paredes do meu estômago !
            Mamãe colocara cinco pães e dois peixinhos na minha mochila. Um lanche e tanto. Olhei algumas mães ao redor e as crianças com aqueles olhinhos pedintes que não tinha como não perceber. Pensei em repartir meu lanche com algumas pessoas. Lógico que não ia dar pra todo mundo mas pelo menos poderia dividir e ajudar algumas pessoas.
            Quando estava para repartir em partes iguais os pães, reparei uns passos largos, mas firmes atrás de mim. Ao levantar os olhos surgiram dois dos discípulos do mestre na minha frente. Reconheci pelas roupas e sandálias iguais as do mestre que usavam. Um deles tocou em minha mão e disse:
-         Rapaz, o que você tem aí escondido ?
-         É meu lanche, moço. Minha mãe fez pra mim
-         O mestre precisa deste lanche para alimentar a multidão – disse o outro.
-         Mas como meu lanche vai poder alimentar toda esta gente?
-         Meu filho, eu não sei, mas se o mestre disse pra gente conseguir comida e levar pra ele, é o que vamos fazer. Precisamos de seu lanche – e já foi pegando um dos peixes que eu tinha trazido.
-         Opa, opa... peraí. Se o mestre precisa do meu lanche, eu posso dar sim. Mas quero ir pessoalmente entrega-lo – eu não ia perder a oportunidade de conhecer o mestre pessoalmente. O mais perto que cheguei dele foi quando tinha expulsado um espírito maligno de um menino que estava se batendo tanto que foi bater na porta da minha casa. Quando abri, lá estava o mestre levantando a mão e libertando o menino. Agora aquela era a minha chance de poder chegar perto dele.
-         Mas que menino folgado. Olha aqui rapaz, você não sabe o problemão que temos pra resolver aqui ? E agora você fica...
-         Calma Pedro, calma – disse o outro para o discípulo mais nervoso que estava com uma cara que denunciava sua vontade de me dar um cascudo e tomar meu lanche.
-         Tudo bem menino, vamos lá.
Começamos a andar, eles na frente e eu atrás, ajeitando os pães e peixes na minha mochila. Nos aproximamos dos outros discípulos e todos me entreolharam com uma cara de espanto e expectativa. No centro de todos eles, sentando em uma pedra, estava o mestre.
Não sei dizer o que senti ao vê-lo mais uma vez. Mas agora, ele olhou diretamente pra mim. Fixou seus olhos nos meus e um frio percorreu a minha espinha. Mas eu não estava com medo. Era um sentimento de temor, algo muito mais forte do que eu sentia quando sabia que meu pai estava com a vara na mão para me corrigir.
-         Rapaz, você vai compartilhar com toda essa gente o lanche que sua mãe fez com todo carinho para você? – o mestre falou olhando sempre nos meus olhos.
-         Mestre, se o senhor precisa dele, com todo o prazer eu cedo para o senhor.
-         Obrigado meu filho.
-         Mas mestre, o que são cinco pães e dois peixinhos para toda essa gente?
-         Foi o que nós já dissemos a ele rapaz – disse Pedro, que identifiquei pela fala rude e ríspida e que tinha me ameaçado antes.
O mestre acenou com a mão, fazendo um gesto para Pedro não falar mais. Se levantou e chegou bem perto de mim. Estendeu as mãos e tomou meu lanche, dizendo:
-         Jacó, não se preocupe com isso. A parte de vocês já foi feita. Agora está nas mãos de meu pai.
Como ele sabia meu nome ? Eu não tinha falado nada. Nem os discípulos sabiam. Quem é este que sabe todas estas coisas ?
Senti que os discípulos queriam que eu fosse embora. Começaram a me empurrar mais pra trás e dando sinal de que eu já tinha feito o que queria e agora precisa deixar o mestre em paz. Mas tudo isso foi interrompido pelas palavras do mestre. Ele levantou um pão e um peixe bem alto com as mãos e orou:
- Bendito és tu, Senhor Deus, rei do universo. Que nos fornece o alimento para suprir nossas necessidades.
Olhei para o povo. A multidão estava como que hipnotizada, olhando para ele, mas com uma cara de que algo novo estava para acontecer, como se já soubessem quando o mestre ia fazer algo extraordinário.
O mestre solicitou que a multidão toda se assentasse em grupos, para facilitar a distribuição. Depois pediu para cada um dos discípulos que pegasse um cesto grande, e colocou um pedaço de pão ou peixe em cada um destes cestos e mandou que eles distribuíssem.
Vi a cara deles ao pegarem os cestos e se dirigir à multidão. Era uma cara assim de que estavam fazendo algo inútil, porque além do pedaço que levavam em cada cesto ser insuficiente, ainda poderia dar em confusão, porque uma multidão faminta pode ficar fora de controle. Eu então, tinha um sentimento de incapacidade e impotência, sem poder fazer muita coisa.
Mas o mestre estava com uma cara ótima. Parecia que via um anjo. Olhava satisfeito para a multidão como que antevendo o que estava para acontecer.
De repente, começaram os risos. Sorrisos e gargalhadas se espalhavam por todo o vale onde estávamos assentados. Não havia empurra-empurra e nem discussão. Nenhuma confusão e nem gritaria. Achei impossível. Como pode uma multidão faminta estar satisfeita com algumas migalhas de comida ?
Corri em direção de um dos discípulos. Ele tinha largado o cesto no chão e estava com as mãos na cabeça maravilhado e sorrindo um sorriso tão grande que era quase de orelha a orelha. As pessoas em volta colocavam a mão e tiravam um pão e um peixe, inteiros, de dentro do cesto. Cheguei mais próximo e olhei dentro do cesto:
- Incrível. Não é possível ! Como pode isto acontecer ? É um milagre !!
O cesto estava cheio de pães e peixes! Quase até a boca ! E não importava o quanto tiravam do cesto, os pães e peixes não acabavam. Olhei para os outros cestos e todos estavam da mesma forma. Os discípulos, todos atônitos, uns distribuíam dando risada, outros choravam. Um tinha desmaiado e outro gritava:
- É ele! É o profeta que Moisés disse que viria! É ele ! Yeshua Hamashia ! Multiplicou os pães como na época de Elias ! É ele, É ele !
Aproveitei e meti a mão no cesto e peguei logo dois pães e três peixes. Comi gostoso como se fosse um rei em seu palácio, comendo um banquete com seus súditos. Minha alegria só era superada pelas crianças que além de comerem mais do que eu e mais rápido, ainda ficavam fazendo guerrinha de miolo de pão uns contra os outros, aos berros de protesto de suas mães, é claro.
O tempo passou rapidamente depois disto. As pessoas pegavam o alimento e iam embora. Depois de uma hora, praticamente todas as pessoas já estavam longe no horizonte, e os doze carregavam os cestos e arrastavam para junto do mestre. Um detalhe: todos os doze cestos ainda estavam cheios, mesmo após o ataque ávido de uma multidão de mais de cinco mil pessoas, no mínimo. Mas eu continuava comendo. O peixinho tava uma delícia.
O sentimento em meu coração mudou totalmente. Enquanto me afastava, indo pra casa, tentava digerir, além da montanha de pão e peixe que comi, o fato histórico que eu presenciei. Algo que eu nunca mais esqueci na vida. Enquanto arrotava, ia pensando se algum dia iria ver novamente o mestre.
Ao chegar em casa, minha mãe já preocupadíssima, ralhou comigo:
-         Jacó, até que enfim ! Isto são horas de chegar ? Já está quase na hora do jantar.
-         Tá bom mãe. Só vou tomar um banho. O que tem para o jantar ?
-         Meu filho, hoje tive que improvisar. Só tem pão e peixe.
-         Cataplaf !!
-         Filho, filho ? Jacó ? O que aconteceu ? Você escorregou ? Jacóóóóó.....

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